domingo, 6 de abril de 2008

Soraya Magalhães: Erik Satie

Antes de qualquer coisa, Erik Satie era um debochado. No melhor sentido da palavra. É fácil constatar isso lendo um pouquinho de sua vida e ouvindo sua música maravilhosa odiada pelos críticos e músicos de sua época. Mas ele não dava muita bola pra isso, não. Ao contrário, nomeava suas obras com os nomes mais esdrúxulos e curiosos que pudesse fazer. Os críticos não gostavam dele. Mas ele tampouco admirava os críticos. Então agradá-los estava fora de questão. Daí a simplicidade visceral com que compunha monumentos do surrealismo precursores da pós-modernidade.

O próprio Satie se julgava incapaz de cometer os virtuosismos tidos como símbolos de competência e talento musical. Daí a excelência de suas composições minimalistas e verdadeiras que jogavam qualquer crítica acadêmica e maledicente na fogueira..
- Alto lá, você diz pós-modernidade? Mas ele morreu em 1925. -
Sim, mas o mesmo teimava em enfiar goela abaixo não a pureza melódica isolada da música, mas os barulhos externos, as conversas, sons de máquinas de escrever, sirenes, tiros de pistola, enfim, o movimento.

Acima de tudo, Satie era sincero com ele mesmo. Ele usava as armas que tinha. Ousado de doer, o ‘excêntrico’ após seguir a seita Rosacruz resolveu, em ato anárquico, fundar sua própria seita, a qual tinha um único dogma: quem descordar é excomungado.
A princípio pode até parecer um ditador, mas, olhando bem, é como um empurrão do tipo “se não gostou, faça a sua”.



E esses empurrões tocaram muita gente boa – os que se deixaram tocar – como Debussy, Picasso, Jean Cocteau, entre outros, que se juntavam a ele nos cabarés parisienses e na arte. Esta última dita assim de forma bem geral, sem classificar ou separar nada, até porque o mesmo lançou livros – um deles sucesso de vendas com o maravilhoso nome de ‘mémories d´un amnésique’- escreveu balés, compôs enfim o que apresentou ao mundo como música-mobília, a qual convivia forçosamente, mesmo à revelia dos ouvintes, com tudo o que tivesse ao redor.

Diante disso, só nos resta mobiliar a casa, o peito, os pulmões e, sobretudo, a alma com a belíssima obra desse genial compositor.
Avoir l´air.



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